quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A Revolucionária Experiência de Ambroise Paré

"Não te atrevas a me ensinar cirurgia, tu que nada mais fizeste a não ser ler livros. Cirurgia aprende-se trabalhando com as mãos e os olhos." Ambroise Paré

Ambroise Paré, que iniciou sua carreira como aprendiz de cirurgião-barbeiro na França, revolucionou a história da cirurgia através da introdução de diversas inovações na prática médica. Até então vista como uma atividade não médica, relegada à confraria dos barbeiros, a cirurgia resumia-se a atos operatórios drásticos e muitas vezes brutais, em que a preservação dos tecidos ficava em segundo plano. O texto abaixo, escrito pelo próprio Paré, descreve um momento transcedente na história da cirurgia:

“No ano de 1536, Francisco, rei da França, enviou uma grande força expedicionária ao Piemonte para conquistar Turim. Ao ataque maciço de nossas forças, os defensores das fortificações defenderam-se desesperadamente, matando e ferindo muitos soldados com vários tipos de armas, mas especialmente armas de fogo. Os cirurgiões tiveram muito trabalho. Eu, para dizer a verdade, era ainda um principiante; nunca vira tratar ferimentos produzidos por bala. Tinha lido no oitavo capítulo do primeiro livro de Giovanni da Vigo, Delle ferite in generali, que tais ferimentos eram perigosos por causa da pólvora, e que o melhor meio de tratá-los era a cauterização com óleo fervendo. Eu sabia que isso causaria uma terrível dor; só depois de me certificar que os cirurgiões usavam mesmo o óleo na mais alta temperatura possível, tive coragem de imitá-los. Faltando-me o referido óleo, fui obrigado a usar uma mistura de gema de ovo, óleo de rosas e terebentina. Naquela noite não dormi; assediava-me o pensamento de que muitos pacientes morreriam porque eu não havia cauterizado suas feridas com óleo fervente. Antes do nascer do sol levantei-me e fui olhá-los. O que vi superou as minhas mais otimistas expectativas, porque aqueles a quem eu tinha tratado com a mistura por mim elaborada quase não sentiam dor e suas feridas não estavam inflamadas. Outros, a quem eu tinha cauterizado, estavam com dores terríveis e com a parte afetada pelo ferimento inflamada. Nesse momento, decidi que não mais cauterizaria os pobres homens feridos a tiros de arcabuz.” Ambroise Paré, 1538.

Ambroise Paré (1517-1590) era de uma família de cirurgiões-barbeiros do interior da França. Trabalhou no Hôtel-Dieu, em Paris; como não sabia grego nem latim, foi recusado pela universidade. Tornou-se então cirurgião militar, ocasião em que fez a revolucionária experiência acima e que foi apenas o início de uma longa série de contribuições à cirurgia.

Não é de admirar que tenha se tornado o cirurgião de quatro reis da França, Henrique II, Carlos IX, Francisco II e Henrique III. Paré criou novos instrumentos cirúrgicos e próteses, introduziu importantes modificações na técnica operatória, por exemplo, na ligadura de vasos. Salvou a vida de números nobres, mas também salvou Coligny, líder dos huguenotes, o que quase lhe custou a vida nos massacres da noite de São Bartolomeu, em a 23 de agosto de 1572, teria sido executado pelos furiosos católicos se o rei Carlos IX não intercedesse em seu favor. Modesto, disse de um oficial a quem salvara: “Eu cuidei dele; Deus o curou”.

REFERÊNCIAS:
1.SCLIAR, Moacyr, "A Paixão Transformada", Companhia das letras, São Paulo, 1996
2.MARGOTTA, Roberto "História Ilustrada da Medicina" Editora Manole - São Paulo, 1998

Um comentário:

  1. Admiro os cirurgiões pela técnica,pela ousadia.Ambroise é um precursor,um símbolo.

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