terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Demência de Alzheimer em "As Viagens de Gulliver" (1726)

Em 1906, Alois Alzheimer registrou na literatura médica a doença que leva seu nome. Entretanto, séculos atrás, observações sobre a demência já haviam sido relatadas não no universo científico, mas na literatura romântica.

A descrição das mudanças comportamentais observadas no envelhecimento que estampa uma das páginas do livro favorito de Voltaire, As Viagens de Gulliver (1726) – assinado por Jonathan Swift, é bastante sugestiva de doença de Alzheimer:

Em seguida, descreveu-me os Struldbruggs, dizendo que eram semelhantes aos mortais e como eles viviam até aos trinta anos; que, depois dessa idade, caíam a pouco e pouco em negra melancolia, que aumentava sempre até atingirem os oitenta; que, por então, não eram apenas sujeitos a todas as enfermidades, a todas as misérias e a todas as fraquezas dos velhos dessa idade, mas a aflitiva ideia da eterna duração de sua miserável caducidade os atormentava a tal ponto que nada podia consolá-los; que não eram simplesmente, como todos os outros velhos, cabeçudos, rabugentos, avarentos, carrancudos, linguareiros, mas gostavam de si próprios, renunciavam às doçuras da amizade, não dispensavam ternura a seus filhos e que, além da terceira geração, já não conheciam a posteridade; que a inveja e a raiva os devoravam continuamente; e que a vista dos sensíveis prazeres de que usufruem os juvenis mortais, os seus divertimentos, os seus amores, os seus exercícios os faziam de certo modo morrer a cada momento; que tudo, até a própria morte dos velhos que pagavam o tributo à natureza, lhes excitava a raiva e os mergulhava no desespero; que, por essa razão, todas as vezes que viam realizar-se um enterro, maldiziam a sua sorte e se queixavam amargamente da natureza, que lhes recusara a doçura de morrer, de acabar a sua aborrecida carreira para entrar num eterno repouso, que já não se encontravam em estado de cultivar o espírito; que a memória enfraquecia; que mal se lembravam do que tinham visto e aprendido na sua mocidade e na idade madura; que os menos miseráveis eram os que tinham entontecido, que tinham perdido completamente a memória e estavam reduzidos ao estado infantil; esses, ao menos, encontravam quem se condoesse deles, dando-lhes todos os recursos de que necessitavam.”
O trecho acima descreve o momento em que Gulliver encontra os luggnaggianos, entre os quais vive a raça imortal de Struldbruggs, indivíduos destinados a nunca morrer, mas que sofrem a devastação e as enfermidades conseguintes a idade avançada.

Inicialmente, Gulliver deduz que essas pessoas são singularmente sábias, dadas as suas décadas de aprendizado e cultura. O protagonista se surpreende ao perceber que, na verdade, os imortais viviam socialmente isolados e deprimidos, sem o alívio final da morte, exibindo todas as consequências negativas de senescência extrema, como a perda da função e redução da vitalidade.

Literatos sugerem que este retrato de senilidade fora elaborado por Swift a partir da observação do seu tio Godwin, que sofreu perda considerável de memória com o envelhecimento.

Neurologistas afirmam que a descrição de Swift seria uma espécie de premonição sobre seu próprio futuro estado mental. Escritos do mais famoso escritor da época refletem seu interesse pelos temas psicológicos e psiquiátricos.

Durante os últimos anos de vida, Jonathan Swift sofreu mentalmente o declínio cognitivo que descreveu, sendo por isso rotulado pelos seus contemporâneos como “o louco”. Dez anos antes de sua morte, em outubro de 1735, seus amigos observaram uma deterioração de sua memória e dificuldade de reconhecer as pessoas. O proprio autor registrou “Eu perdi completamente minha memória e quase não entendo uma palavra do que escrevo”. Em outubro de 1745, aos 78 de sua idade, faleceu o admirável escritor, legando a maior parte de sua fortuna para construir e dotar um hospital para “lunáticos, idiotas e incuráveis".

REFERÊNCIAS:
Miranda CM , Pérez JC , Slachevsky Ch A. "Contribuição científica de Jonathan Swift em suas "Viagens de Gulliver". . Rev Med Chil 2011 Mar; 139.
Lewis, JM. "Jonathan Swift and Alzheimer's disease". Lancet. 1993 Aug 21;342(8869):504.
Lorch, M. "Language and memory disorder in the case of Jonathan Swift: considerations on retrospective diagnosis." Oxford Journals Medicine Brain Volume 129, Issue 11 Pp. 3127-3137.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Bob Esponja e a Síndrome de Williams

A Síndrome de Williams-Beuren, descrita pela primeira vez em 1961 pelo cardiologista neozelandês John Williams, é uma desordem genética rara caracterizada por uma facilidade de relacionamento interpessoal acima da média.

Os indivíduos portadores da síndrome são excepcionalmente simpáticos, apresentam gosto exacerbado por música e, ao comunicar-se, exageram nas expressões faciais e gestos, tendendo a utilizar uma linguagem rica, com termos incomuns, ritmo exagerado e intensidade emocional.

Fenotipicamente, apresentam aparência distinta, com face “élfica”: nariz pequeno e empinado, íris azul, lábios proeminentes, boca entreaberta, dentição pouco desenvolvida e sorriso freqüente.

SpongeBob SquarePants (no Brasil, Bob Esponja Calça Quadrada) é uma série de televisão americana de desenho animado criada pelo biólogo marinho e animador Stephen Hillenburg.

Bob Esponja

Não somente a personalidade, mas também a face do personagem Bob Esponja é parecida com a dos portadores da Síndrome de Williams, com grandes íris azuis, um nariz curto, grosso e arrebitado, uma grande boca contendo poucos e proeminentes dentes.

As semelhanças não param por aí! Bob Esponja é considerado um cantor fantástico, utilizando muitas vezes seu nariz como uma flauta, no que é muito bom.


Analogamente, as crianças com síndrome de Williams possuem habilidades musicais, com facilidade para aprender rimas e canções, demonstrando muita sensibilidade sonora e concomitantemente boa memória auditiva.

Apresentando incoodenação motora, Bob tem sérios problemas com direção, continuando por isso a frequentar as aulas de direção da Senhorita Puff (instrutora da auto escola que Bob estuda).


Também as vítimas da síndrome, por consequência de atraso psicomotor, frequentemente tem problemas de coordenação e equilíbrio.

Embora normalmente visto (principalmente por Lula Molusco) como infantil e estúpido, Bob Esponja é um personagem enérgico, otimista, autoconfiante, determinado, dramático, bondoso e inocente.

REFERÊNCIAS:
Personagens de desenho com transtornos psiquiátricos.
Wikipedia: Bob Esponja
Wikipedia: Síndrome de Williams