“Mas não quero me meter com gente louca”, Alice observou.
“Oh! É inevitável”, disse o Gato; “somos todos loucos aqui. Eu sou louco. Você é louca.”
“Como sabe que sou louca?” perguntou Alice.
“Só pode ser”, respondeu o Gato, “do contrário, não estaria aqui.” Lewis Carroll
A Síndrome de Todd foi descrita em 1955 pelo psiquiatra inglês John Todd que, leitor e fã de Lewis Carroll, propôs que a chamassem de Síndrome de Alice no País das Maravilhas. Trata-se de uma desordem neurológica que afeta a condição humana de percepção, proporcionando uma distorção do espaço, tempo e imagem corporal. Está freqüentemente associada com tumores cerebrais, uso de drogas psicoativas (incluindo cogumentos alucinógenos; LSD) e, principalmente, com enxaqueca. Seja qual for a causa, as distorções podem ocorrer várias vezes ao dia e podem durar de minutos a semanas. O sofredor vê os objetos com o tamanho e/ou forma errada, há uma considerável alteração da perspectiva e do senso do tempo; é comum a distorção do tamanho de outras modalidades sensoriais, bem como a imagem do próprio corpo. Afeta também sensação de toque e audição; usualmente ocorrem intensas alucinações e a interpretação de diversos eventos pode estar prejudicada. Alguns distúrbios podem estar associados, dentre eles: apraxia, agnosia, alterações de linguagem e delírios. A leitura de “Alice Através do Espelho” e “Alice no País das Maravilhas” possibilita-nos conhecer as evidências sintomatológicas que justificam tal nomenclatura:
Macropsia
[...] Era certamente um Mosquito muito grande: “Mais ou menos do tamanho de uma galinha”, Alice pensou.
[...] "E que flores enormes devem ser aquelas!” foi o que pensou em seguida. “Como se fossem cabanas sem teto e com hastes... e que quantidade de mel devem produzir.”
Micropsia
[...] No entanto, aquilo era tudo menos uma abelha comum: era um elefante...
Alteração da perspectiva
[...] quanto mais ando em direção ao ovo, mais longe ele parece ficar.
[...] A loja parecia cheia de toda sorte de coisas curiosas... mas o mais estranho de tudo era que, cada vez que fixava os olhos em alguma prateleira para distinguir o que havia nela, essa prateleira especifica estava sempre completamente vazia, embora as outras em torno estivessem completamente abarrotadas.
Alucinação
[...] Todo tipo de coisas aconteceu ao mesmo tempo. As velas cresceram todas até o teto, parecendo um canteiro de juncos com fogos de artifício na ponta. Quanto as garrafas, cada uma se apossou de um par de pratos, ajeitando-os rapidamente como se fossem asas, e assim, usando garfos como pernas, saíram esvoaçando para todo lado –“se parecem muito com pássaros”, pensou Alice.
Afetação tátil
[...] No seu pavor, agarrou o que estava mais perto da sua mão, que calhou ser a barba da Cabra. Mas a barba pareceu se dissolver quando ela a tocou.
Afetação da linguagem
[...] “Cada vez mais estranhíssimo!” exclamou Alice (a surpresa fora tanta que por um instante realmente esqueceu como se fala direito)
[...] Começou a recitar, mas sua voz soava rouca e estranha e as palavras não vieram como costumavam.
Afetação auditiva
[...] De onde vinha o barulho, Alice não conseguia distinguir: o ar parecia repleto dele, e ressoava em toda a sua cabeça até deixá-la completamente surda.
Distorção da percepção das formas
[...] Alice agarrou o bebê com certa dificuldade, pois a criaturinha tinha uma forma estranha, com braços e pernas esticados em todas as direções “Igualzinho a uma estrela do mar” pensou Alice.
[...] Não havia a menor dúvida de que possuía um nariz extremamente arrebitado; além disso, os olhos eram um tanto miúdos para um bebê: no todo, Alice não gostou da aparência da criatura.
Distorção da percepção da própria imagem corporal
[...] Seu queixo estava tão comprido contra seu pé que mal tinha como abrir a boca.
[...] descobriu que não achava seus ombros em lugar algum: tudo o que conseguia ver, quando olhava pra baixo, era uma imensa extensão de pescoço.
Sensação de encolhimento ou crescimento
[...] Que sensação estranha!” disse Alice; “devo estar encolhendo como um telescópio!”
[...] ”Agora já estou espichando como o maior telescópio que já existiu! Adeus, pés!” (pois quando olhou para eles, pareciam quase fora do alcance de sua vista, de tão distantes).
[...] Sentiu a cabeça forçando o teto e teve de se abaixar para não quebrar o pescoço”.
Dissociação [...] “Quem é você?” perguntou a lagarta
“Eu... eu mal sei, Sir, neste exato momento... pelo menos sei quem eu era quando me levantei esta manhã, mas acho que já passei por várias mudanças desde então”
“Que quer dizer com isso? Esbravejou a Lagarta. “explique-se!”
“receio não poder explicar”, respondeu Alice “porque não sou eu mesma, entende?”
“Então, acha que está mudada, não é?”
“Receio que sim, Sir”, disse Alice. “Não consigo me lembrar das coisas como antes...”
[...] “E agora, quem sou eu? Vou me lembrar, se puder! Estou decidida!” mas estar decidida não ajudou muito...
Micropsia + Macropsia
[...]Mas a rainha já não estava ao seu lado: reduzira-se subitamente ao tamanho de uma bonequinha, e agora estava sobre a mesa, correndo alegremente em voltas e mais voltas à procura de seu xale, que se arrastava atrás dela [...] só seu rosto foi ficando muito pequeno, e os olhos ficando grandes e verdes, e cada vez mais, enquanto Alice continuava a sacudi-la, ia ficando menor... e mais gordinha... e mais macia... e mais redonda... e...afinal de contas era mesmo uma gatinha.
[...]Mais tarde, contou que nunca em toda sua vida vira uma cara como a que o Rei fez ao ser erguido e espanado no ar por uma mão invisível. Ele ficou espantado demais para gritar, mas seus olhos e sua boca foram ficando cada vez maiores, e cada vez mais redondos...
A obra de Carroll também é responsável por outro epônimo médico: a Síndrome de Cheshire Cat (SCC), descrita pela primeira vez em 1968 pelo médico britânico Eric George Lapthorne Bywaters.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
J. Todd:
Alice in Wonderland syndrome. Canadian Medical Association Journal, Ottawa
Lewis Carroll:
Alice no País das Maravilhas. Londres 1865.
Através do Espelho e o que Alice Encontrou por Lá
Nossa! Que interessante! Não conhecia essa síndrome ainda... Bjo!
ResponderExcluirNo final do livro Lewis Carroll fala : O autor sabe muito bem o quê Alice sentia.
ResponderExcluirIsso e outras evidências relata que o autor Lewis Carroll tinha esta síndrome, li isto num artigo de psiquiatria.
Este livro é bastante abordado pela vanguarda psicodélica , uso de alguns alucinógenos produz efeitos semelhantes como jah diz o texto.
Já conhecia a síndrome...
ResponderExcluirMas essa abordagem com trechos da obra de Lewis Carroll é um presente para médicos e fãs de literatura.
Obrigado!!
eu tenho essa síndrome descobri aos 12 anos.E é difícil explicar as pessoas oq sinto eles naõ entendem.Ja faço tratamento com medicamentos á 7 anos + é uma doença q nao afeta o meu relacionamento com as pessoas .Posso estar passando mal sem que ninguém percerba,mas com o passar dos anos vc aprende a lidar com os sintomas..
ResponderExcluirOi, como você está? Essa Síndrome começou quando você tinha quantos ano?
ExcluirTive esses sintomas um ano atraz, mais de vez em quando tenho eles de volta é insuportatavel não consigo fazer as coisas direito, tenho senssação de que estou doida , tentei procurar um medico mais eu nao sei que tipo de medico devo procurar
ResponderExcluirPsiquiatra. Pq esses sintomas são controlados por medicamentos. E
ExcluirProcure um neurologista
ResponderExcluirFrequentemente, somente quando estou de olhos fechados, perco a nocao do tamanho do meu corpo e dos objetos. Meu corpo parece que está encurtando e aumentando. A sensacao as vezes é tao forte que nao consigo dormir...Será que tem algo a ver com essa sindrome?
ResponderExcluirsofria muito de Micropsia quando era adolescente, os sintomas apareciam quando eu ficava certo tempo conversando com alguem, pra onde eu focava, se distorcia, ficando extremamente minusculo, quando olhava pro chao, sentia q estava muito alto, me sentia tonto e nao conseguia me mover por causa da tontura, e continuando conversando com a pessoa, olhando no rosto dela, a cabeça dela ficava extremamente menor q o resto do corpo.
ResponderExcluirEra uma sensaçao desagradavel, mas nunca consegui explicar para alguem o que sentia, ate que a pouco tempo li sobre isso em um blog.
Você tinha muitas dores de cabeça??
ExcluirOLA, MEU NOME E CRISTIANO TENHO 32 ANOS E HJ LENDO UM ASSUNTO SOBRE DOENÇAS CURIOSAS ME DEPAREI COM ESSA SINDROME QUE APRESENTA ESSES SINTOMAS, E O CURIOSO E Q SINTO TODOS ESSES SINTOMAS DESDE OS 10 ANOS DE IDADE NUNCA SOUBE EXPLICAR E TINHA ATE VERGONHA DE DIZER POIS QUANDO TENTEI CONTAR O Q SENTIA, ACHARAM Q ERA BOBAGEM MINHA. QUANDO ERA CRIANÇA ERAM CONSTANTES PRINCIPALMENTE A NOITE E SINCERIDADE EU SENTIA ATE MEDO, MAS HJ EM DIA SAO RARAS AS VEZES Q VENHO A SENTIR E NOTEI Q ACONTECE NA MAIORIA DAS VEZES A FRENTE DA TELEVISAO PERCO A NOÇÃO DA DISTANCIA E DO TAMNHO DE TUDO EM MINHA VOLTA OS PASSOS PARECEM MAIS LENTOS E TUDO MAIS ALTO E MINHA AUDIÇÃO FICA ESTRANHA COMO SE FICASSE MAIS AGUÇADA, MAS ESSAS "CRISES" N DEMORAM POR MAIS DE 20 MINUTOS HJ EM DIA; EU QUERIA SABER SE POSSIVEL ALGUEM ME INFORMAR SE ESSES SINTOMAS COM O PASSAR DO ANOS PIORAM?
ResponderExcluirOi, poderia me dizer sobre oq você sente hoje em dia em relação dessa síndrome?
ExcluirQuando eu era criança por volta dos meus sete anos eu lia este livro e achava completamente sem graça e não entendia absolutamente nada. Por mais mágico que seja o pensamento de uma criança, para ela, existe uma " lógica" em suas idéias. Esta obra, é definitivamente o tipo de literatura que deveria ser trabalhada com adolescentes e de uma forma direcional. Sem um breve conhecimento sobre a síndrome, ou mesmo sobre o que é ilusão, efeito e causas, a obra ao meu ver, não ganha seu devido valor.
ResponderExcluirLol, realmente, para muitos a obra é considerada "sem graça" e indigna de tanto sucesso. Confesso que também não era grande fã da história até conhecer um breve contexto (ininteligível do ponto de vista infantil) da história de vida de Lewis Carrol. Também há certas belas lições vitais embutidos na obra, à exemplo, o seguinte diálogo:
ResponderExcluir"Podes dizer-me, por favor, que caminho devo seguir para sair daqui?
Isso depende muito de para onde queres ir - respondeu o gato.
Preocupa-me pouco aonde ir - disse Alice.
Nesse caso, pouco importa o caminho que sigas - replicou o gato."
Enfim, eu, que considerava a história desprovida de sentido, tive que le-la intensamente para conseguir gostar. Em suma, "Tudo tem uma moral se você conseguir simplesmente notar." (L. Carrol).
Beijos e obrigada pela visita.
Já faz parte da minha rotina visitar este blog e me deliciar.Recomendo a todos amigos da área médica e até mesmo de outras áreas.Mais uma vez, obrigado e parabéns.
ResponderExcluirFernando, obrigada você pelas visitas e recomendação! :)
ResponderExcluireu tenho essa síndrome é horrivel ver tudo longe e as letras perto :(
ResponderExcluirÉ bem interessante isso. Tenho os dois livros de Alice, sou uma grande fã da saga devido à fantasia do enredo. Não conhecia essa síndrome, achei muito interessante o post.
ResponderExcluir"Amyh", relativamente, muitas pessoas ainda desconhecem a síndrome. Também sou grande admiradora da mente "fantasiosa" de Lewis. Obrigada!
ExcluirIncrível! Obrigada!
ResponderExcluiré que um dia eu dormi no sofá:
ResponderExcluirdai eu acordei do nada muito apavorado
e olhei para a portaa e ela estava a uns 30 m de distancia
mas na verdade saun 11
dai olhei para a TV e estava do tamanho do meu dedão
fiquei muito apavorado e comecei a correr da TV para a porta umas 3 vezes
olhei para o relógio era 1:30
parei e fiquei assistindo TV por muito tempo() , mas na verdade só foi meia hora
e depois passou e eu dormi
Aconteceu alguns anos atrás, tenho 13 anos.
ainda tenho isso depois que eu ando muito(muito) e olho para uma coisa clara e repetitiva, o céu por exemplo, para o centro de meu olhar parece que tudo vai em direção a ele.
Venho buscando informaçoes sobre esses sintomas...meu filho de oito anos esta tendo essas crises.Fico bastante assustada.Vou marcar um neuropediatra.Alguem sabe me dizer qual é o tratamento?
ResponderExcluirAchou algum tratamento para ele? como ele está agora???
ExcluirEu tinha isso quando era criança. Sentia que tudo aumentava e diminuía, principalmente quando eu deitava para dormir. A cama aumentava e eu me sentia lá em cima, depois diminuia e eu me seni lá embaixo.... Lembro que uma época tinha a sensação de dia tbm. Na época contei aos meus pais, mas eles não se importaram. A última vez que tive essa sensação foi quando eu tinha 16 anos, porém nesse dia tinha algo a mais, tive uma sensação de pânico tbm. Foi terrível. Graças a Deus nunca mais tive. Eu me identificava muiiiiiito com o desenho da Alice na minha infância. Na minha adolescência eu até dizia que poderia ser ela, se não fosse a cor dos cabelos rsrsrs. E agora que estou com 28 anos vejo que algumas pessoas passam por isso. Muito curioso a descoberta dessa noite.
ResponderExcluirVocê tinha muitas dores de cabeça??
Excluirhoje eu tive uma crise dessa sindrome
ResponderExcluirpassei horas com a visão bugada e sem conseguir levantar
depois que melhorou eu fiquei com a cabeça meio pesada :(
amanha vou procurar um neuro
Tive isso desde as primeiras lembranças de infância, em torno de 5 e 6 anos. Nunca soube explicar exatamente para a família o que sentia. Muitas noites de sono perdidas. Geralmente acontecia na hora de dormir. Com o passar dos anos foram reduzindo os episódios e fui aprendendo a me controlar. Eventualmente agora com 38 anos ainda acontece, mas dura poucos minutos e ninguém percebe. Conversei há alguns meses com um amigo neuropediatra e ele não soube diagnosticar porque eu tmb não soube explicar, mas hj através desse blog consigo ter a clara noção da experiência vivida por anos em silêncio. Obrigado pela publicação.
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