terça-feira, 6 de julho de 2010

Frida Kahlo: Vida Marcada por Doenças

"Pés, para que os quero se tenho asas para voar." Frida Kahlo

Maldalena Carmen Frida Kahlo retrata a trajetória de um dos maiores ícones das artes plásticas do México e do mundo. Com sua singular biografia e uma produção artística riquíssima, Frida expressava, em grande parte de suas pinturas, a dor e a mutilação, presentes, diariamente, em sua rotina de vida:

ESPINHA BÍFIDA

O primeiro problema neurológico apresentado por Frida Kahlo, espinha bífida, iniciou-se antes mesmo de seu nascimento. Espinha bífida significa espinha cindida ou dividida. Esta divisão se dá nas primeiras semanas de gravidez, quando a medula espinhal, então em formação, não se fecha corretamente. Dependendo da gravidade da fusão, a espinha bífida pode ser assintomática ou associada a diferentes manifestações esqueléticas, urogenitais e neurológicas, incluindo deformações e desordens tróficas das extremidades, paresia e outras. A maioria dos estudos bibliográficos ignoram tal patologia ou a citam de forma rápida, sem especificidade. Entretanto, sabe-se que a maior parte dos problemas ortopédicos apresentados pela pintora, têm relação direta com tal anormalidade do tubo neural. Apesar de não existirem documentos médicos especificando o defeito congênito, uma pintura intitulada: “O que eu vejo na água”, aponta tal anomalia. O elemento dominante da pintura é a presença dos pés aderidos na banheira. A presença de deformidades no hálux e segundo dedo no pé direito, é um defeito típico associado ao disrafismo congênito, incluindo a espinha bífida:



" O que eu vejo na água", 1938

Outro fato que marcou sua infância foi ter contraído poliomielite aos seis anos de idade. A doença a deixou como marcas a musculatura atrofiada e o membro inferior direito mais curto. Para encobrir a deficiência, Frida passou a usar saias longas como as das indígenas mexicanas. Já famosa, as intelectuais de sua época e as mulheres de um modo geral acharam que ela estava lançando moda e começaram a também usar aquelas saias longas.

TRAUMAS DA COLUNA VERTEBRAL E A “ÁRVORE DA ESPERANÇA”

Em 17 de setembro de 1925, na Cidade do México, um bonde bateu em um ônibus. O acidente seria esquecido se dentro do segundo veículo não estivesse a jovem Magdalena Carmen Frida Kahlo. A colisão moldou a existência da mais valorizada pintora latino-americana. Aos 18 anos, ela teve a coluna comprometida em três regiões, a perna dilacerada, o pé esmagado e a cintura pélvica fraturada. Uma barra de ferro ainda atravessou seu abdome. O sofrimento foi representado em sua arte com traços mórbidos:

Árvore da Esperança, Mantém-te Firme (1946).Frida Kahlo (1907-1954).Óleo. 56 x 40.5 cm. Galeria de Artes Isadora Ducasse (Nova York)

Sobre A Árvore da Esperança, Frida escreveu em seu diário: "Estou quase terminando o quadro que nada mais é que o resultado da tal operação. Estou sentada à beira de um precipício - com o colete em uma das mãos. Atrás estou deitada numa maca de hospital - com o rosto voltado para a paisagem - um tanto das costas está descoberto, onde se vê a cicatriz das facadas que me deram os cirurgiões filhos de sua recém-casada mamãe."

Segundo ela, um verdadeiro milagre a permitiu sobreviver: porém, lhe deixou graves seqüelas físicas. Devido a fratura de pelve, Frida foi informada de que não poderia ter filhos de parto normal, e era recomendável portanto que evitasse engravidar. O mesmo acidente destruiu seu sonho de ser médica. Em 1929 ela sofreu o primeiro aborto; em 1932, o segundo e último. Seu grande desejo era ter filhos, e a impossibilidade de concretizá-lo naturalmente deixou-a extremamente traumatizada.Felizmente, mais adiante, conseguiu voltar a caminhar. A artista foi submetida a mais de trinta operações e, mesmo assim, nunca deixou de pintar.

A COLUNA PARTIDA

Em 1944, Frida pintou o auto-retrato intitulado A Coluna Partida. A obra expressa o sofrimento da artista, pois sua saúde piorara a ponto de ter de usar um colete de aço. Uma coluna artificial, partida em vários lugares, toma o lugar de sua coluna fraturada. As rachaduras em seu corpo e os pregos espalhados pela superfície corporal são símbolos da dor e solidão:

“A coluna partida”, 1944.

A DOR DE UMA MÃE QUE PERDEU O FILHO

Em 1932, Frida pintou o quadro O Hospital Henry Ford, também conhecido como A Cama Voadora. O quadro mostra a pintora deitada no leito do hospital, localizado em Detroit, EUA. Flutuando sobre o leito, pode ser visto um feto do sexo masculino, um caramujo e um modelo anatômico de abdome e de pelve. No chão, abaixo do leito, são vistos uma pelve óssea, uma flor e um autoclave. Todas as seis figuras estão presas à mão esquerda de Frida por meio de artérias, de modo a lembrar os vasos de um cordão umbilical. O lençol sob Frida está bastante ensangüentado. Seu corpo é demasiadamente pequeno em relação ao tamanho do leito hospitalar, de modo a sugerir seu sofrimento e sua grande solidão:


Cama Voadora (1932).Frida Kahlo (1907-1954).Óleo sobre metal 77,5 x 96,5.Coleção Fundaçao Dolores Olmedo (México)

Do olho esquerdo de Frida goteja uma enorme lágrima, simbolizando a dor de uma mãe pela perda do filho; a pelve óssea é um testemunho da causa anatômica da impossibilidade de ser mãe.

O CARINHO POR SEU MÉDICO NO PERÍODO MARCADO POR INÚMERAS CIRÚRGIAS (1950-1951)

"Estive doente durante um ano: 1950-1951. Sete operações na coluna. O Dr. Farill salvou-me. Restituiu-me a alegria de viver. Ainda estou numa cadeira de rodas e não sei quando poderei voltar a andar de novo.Tenho um colete de gesso que, em vez de ser horrivelmente maçador, me ajuda a suportar melhor a coluna. Não sinto dores, só um grande cansaço... e, como é natural, por vezes desespero. Um desespero indescritível. No entanto quero viver. Já comecei o pequeno quadro que vou dar ao Dr. Farill e que estou fazendo com todo meu carinho por ele”.

“Auto-Retrato com o Dr. Juan Farril”, 1951

Nessa pintura, Frida Kahlo aparece numa cadeira de rodas, em frente a um retrato do seu médico, num cavalete. Uma espécie de oferenda ao médico que salvou a artista do seu sofrimento e aparece no lugar de santo. A paciente pinta a tela com seu próprio sangue e utiliza o coração como pincel.

EPISÓDIO DA AMPUTAÇÃO

Em 27 de julho de 1953, Frida tem a perna direita amputada até a altura do joelho. Em seu diário, encontra-se o desenho da perna amputada como uma coluna rodeada de espinhos.

"Amputaram-me a perna há 6 meses, deram-me séculos de tortura e há momentos em que quase perco a razão. Continuo a querer me matar. O Diego é que me impede de o fazer, pois a minha vaidade faz-me pensar que sentiria a minha falta. Ele disse-me isso e eu acreditei. Mas nunca sofri tanto em toda a minha vida.Vou esperar mais um pouco..."

Após atentar diversas vezes contra a própria vida, Frida Kahlo, que havia contraído uma grave pneumonia, foi encontrada morta no dia 13 de julho de 1954. Embolia pulmonar é a causa registrada em seu atestado de óbito, no entanto, a última anotação em seu diário permite aventar-se a hipótese de suicídio:

"Espero alegre a saída e espero nunca voltar."

Apesar do explícito sofrimento em sua obra, Frida nunca pintou com o interesse de se lastimar; pelo contrário, as imagens cruentas que vemos em muitos de seus quadros – colunas partidas, abortos, sangue, mortes – manifestam uma espécie de provocação, de atitude desafiante frente ao mundo, porque ela era assim. Fosse para buscar a si mesma ou para expressar toda sua sensibilidade, Frida retratou-se no conjunto de sua obra. Poucos artistas se revelaram tanto. Poucos tiveram – como ela teve – na arte o seu maior conforto.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Marco Orsini 1; Marcos RG de Freitas 2; “Frida Kahlo: A arte como desafio à deficiência e à dor, com enfoque na poliomielite anterior aguda” Rev Bras Neurol,44,3:5-12;2008
BEZERRA, A.J.C.; As belas artes da medicina. Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal, Brasília, 2003.

16 comentários:

  1. O filme que conta a biografia da Frida Kahlo, interpretada por Salma Hayek, é muito bom nesse sentido. Podem,os ver a associação do que acontecia com ela no decorrer dessas pinturas. Altamente recomendável, e ótima postagem ^^

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Não posso agradecer ao Dr. EKPEN TEMPLE o suficiente por me ajudar a restaurar a alegria e a paz de espírito em meu casamento depois de muitos problemas que quase levam ao divórcio, graças a Deus que eu quis dizer o Dr. EKPEN TEMPLE no momento certo. Hoje posso lhe dizer que o Dr. EKPEN TEMPLE é a solução para esse problema em seu casamento e relacionamento. Entre em contato com ele em (ekpentemple@gmail.com)

      Excluir
  2. muito bom o seu post sobre a pintora Frida,aliás o seu site é muito bom continue atualizando quando der!!!O filme q a Camila sugeriu é esse:
    http://www.youtube.com/watch?v=zudfarZ-ZNk&feature=related

    =)

    ResponderExcluir
  3. Frida é fantástica, falar sobre ela é sempre uma boa idéia... inclusive para seus pacientes. ;)

    Acabei postando também em homenagem ao dia dela.

    Seu blog é muito legal, parabéns!

    ResponderExcluir
  4. renata seu blog eh sem comentarios! rsrs
    eh café com leite como dizia qndo criança! kkk
    excelente viu! parabens pela forma como vc enxerga, belissima!

    ...ah e o filme q a camila citou eh "Frida"
    mt bom mesmo! assista! ;)
    um bju!

    ResponderExcluir
  5. Que bela e esclarecedora exposição.É tão bom encontrar sitio em que não se lê maldições ou maledicências,mas muito conhecimento científico de modo leve,claro,sem adornos inúteis.

    ResponderExcluir
  6. Não conhecia muito sobre Frida, mas ao ler isso me interessei muito, gosto muito do seu blog, tem uma visão maravilhosa tanto da arte, quanto da medicina!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Mariana, fico feliz em saber que esse texto despertou sua curiosidade. Agradeço a visita! Abraços.

      Excluir
  7. A sua arte de auto retrato me encanta mesmo sendo muito triste a sua história de vida e sofrimento

    ResponderExcluir
  8. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderExcluir
  9. A matéria inspirou uma atividade para o dia da mulher em 2020 no colecol que trabalho! Obrigada!

    ResponderExcluir
  10. Não posso agradecer ao Dr. EKPEN TEMPLE o suficiente por me ajudar a restaurar a alegria e a paz de espírito em meu casamento depois de muitos problemas que quase levam ao divórcio, graças a Deus que eu quis dizer o Dr. EKPEN TEMPLE no momento certo. Hoje posso lhe dizer que o Dr. EKPEN TEMPLE é a solução para esse problema em seu casamento e relacionamento. Entre em contato com ele em (ekpentemple@gmail.com)

    ResponderExcluir
  11. Sou Docente de Traumato-ortopedia do curso de Fisioterapia da Universidade do Estado do Pará há 30 anos...e sempre que possivel gosto de ilustrar minhas aulas com exemplos da arte...cinema..literatura..pintura...noto que os alunos apreciam...parabens pelo blog...(Certa vez tomei emprestada uma obra - a fonte da juventude de Lucas Cranach para ilustrar uma aula sobre a velhice...fez muito sucesso..)

    ResponderExcluir
  12. Sobre o comentario anterior...sou o professor Nelson Higino

    ResponderExcluir